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DESVENDAR O CAMINHO DO ADN

Pelo facto de estarmos expostos à alimentação ao longo de toda nossa vida, desde a fase intra-uterina, há particular interesse em saber como se dá a interação entre nutrientes e compostos bioativos de alimentos com o genoma e qual o seu impacto na saúde. A estreita relação entre a nutrição e a medicina têm raízes tão antigas quanto o século IV a.C, quando Hipócrates sugeriu que a nutrição balanceada poderia ser uma alternativa válida à medicina para manter a boa saúde.

A aplicação de tecnologias moleculares às ciências nutricionais nos últimos 40 anos levou ao reconhecimento de que alguns nutrientes e componentes bioativos dos alimentos podem regular a expressão de genes específicos, tanto na transcrição como a nível pós-transcrição de ADN. Daí que, rompendo a visão da nutrição clássica, a Nutrigenética e Nutrigenómica abre novas perspectivas quanto à nutrição. A nutrição já não é "apenas um meio de alimentar a nossa máquina", mas sim algo muito mais complexo e profundamente interrelacionado com as características genéticas específicas de cada organismo vivo.

A Nutrigenética estuda a influência da variabilidade genética entre os indivíduos, a qual é responsável pelas diferenças no estado de saúde e no risco de doenças.

A Nutrigenómica estuda a forma como as interacções entre componentes da alimentação e o genoma afetam o padrão de expressão génica.


A partir dos dados da sequência de ADN humano, constatou-se que, apesar das profundas diferenças existentes entre os indivíduos quanto aos seus fenótipos, como a côr da pele, tipo de cabelo, peso e altura, os seus genomas apresentam similaridade em cerca de 99,9%. A pequena variação interindividual de 0,1% dá-se, principalmente, por meio de alterações discretas na sequência do ADN conhecidas como Polimorfismos de Nucleotídeo Único (SNP- Single Nucleotide Polymorphysms, pronunciam-se “snips”), que existem aos milhões no genoma humano. Muitas vezes, os SNPs podem levar a mudanças na estrutura, função, quantidade ou localização das proteínas codificadas, e alteram inúmeros processos fisiológicos. Além de interferirem em características físicas, os SNPs também podem influenciar o risco para doenças crónicas não-transmissíveis, necessidades nutricionais e resposta aos alimentos.

Pela avaliação da expressão ou silenciamento de determinados genes e respetivas enzimas, pode perceber-se qual o metabolismo afetado, onde está a maior fragilidade e posteriormente adequar os elementos nutricionais de forma a prevenir a doença ou eliminar sintomas.


3 FACTOS SOBRE A NUTRIGENÓMICA:

• PERFIS ALIMENTARES ESPECÍFICOS PODEM MODULAR O DELICADO EQUILÍBRIO ENTRE SAÚDE E DOENÇA, ATUANDO, DIRETA OU INDIRETAMENTE NA EXPRESSÃO GÉNICA.

• A COMPOSIÇÃO GENÉTICA INDIVIDUAL, OU SEJA, A PRESENÇA DE POLIMORFISMOS EM GENES REGULADOS POR NUTRIENTES, AFETA INDIVÍDUOS E POTENCIA OU NÃO RISCO DE DOENÇA.

• DIETAS PERSONALIZADAS, QUE LEVAM EM CONTA O GENÓTIPO INDIVIDUAL REPRESENTAM O OBJETIVO FINAL DE NUTRIGENÓMICA.


NUTRIGENÓMICA E A OBESIDADE

Estudos de restrição energética e modificações alimentares em indivíduos com excesso de peso e obesidade têm fornecido evidências de como os nutrientes afetam a expressão génica. Tem sido demonstrado que quando estes indivíduos fazem alterações alimentares, genes envolvidos com o metabolismo lipídico, glicídico, inflamação e stresse oxidativo apresentam redução de expressão (down regulation), promovendo o equilíbrio do peso ponderal.


NUTRIGENÓMICA E DESINTOXICAÇÃO HEPÁTICA

A expressão génica do gene CYPA1 mostra-se essencial para, a nível hepático, desintoxicar o organismo de substâncias pro-carcinogénicas, muitas vezes que são etiologia de vários cancros como de mama, próstata e gastro-intestinais. Perceber como pela alimentação pode ajudar a formação de enzimas neutralizadoras e ajudar a desintoxicação é um bónus para manter qualidade funcional orgânica do fígado e outros órgãos essenciais.

NUTRIGENÓMICA E A ALZHEIMER


A Apolipoproteína E tem uma multifuncionalidade no metabolismo lipoproteíco e é essencial para o catabolismo de constituintes lipoproteícos ricos em triglicéridos como os presentes no cérebro. Aposta detetada alguma disfunção das Apolipoproteínas, diretamente associada à incidência a Alzheimer, torna-se primordial saber como prevenir de forma específica essa incidência patológica.


Nutrição
ines.pereira@clinicadopoder.pt

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